terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A MORTE DE KIM JONG-IL E O MITO DA DEMOCRACIA BRASILEIRA

Maurelio Menezes




A morte do ditador norte coreano Kim Jong-Il e a reação a ela merece uma reflexão porque coloca em cheque o conceito de democracia. Pelo menos da democracia como praticada no Brasil.  Como sistema político criado pelos gregos ele era definido como um governo em que o poder era do povo, pelo povo e para o povo" ou seja, nele  o povo definiria o que quer e os governantes o atenderiam. No Brasil, um país que se diz  democrata por excelência, o povo quer saúde e não tem, quer segurança e não tem, quer educação publica e de qualidade e não tem, quer transporte decente e não tem, quer salários decentes e não tem, quer... qualidade de vida e não tem. Em compensação, não quer corrupção e tem de sobra.

As imagens do velório de Jong-Il mostram um sofrimento coletivo do povo norte coreano, um choro coletivo como foi definido pelos veículos ocidentais de comunicação. Para o jornalismo brasileiro, o choro demonstra bem o absoluto controle do Estado sobre a população. Será? Se não for um impossível teatro com milhões de atores, o povo chora pela morte dele porque sofre. E sofre por quê? Evidentemente que não é a troco de nada. Será que o que o povo quer aqui e não tem, eles não têm lá?
Jornais, sites e emissoras de TV daqui são unanimes em afirmar que são “imagens divulgadas pela TV estatal” como quem quer dizer que não são confiáveis. Mas comportamento de TV estatal não é o que mais temos aqui, com o poder publico sustentando a todas e a todos? Porque as de lá são suspeitas e as daqui não? Só as de lá manipulam?

Os jornais de hoje são catastróficos quanto ao futuro: a China teme uma desestabilização do comunismo, povo teme pelo futuro porque filho do ditador, que tem menos de 30 anos, pode colocar tudo a perder. Alias, como alguém pode colocar algo a perder se este algo já não existe, Pelo menos é isso que sempre afirmaram nossos veículos de comunicação, já que sempre pintaram a situação na Coréia do Norte como tétrica, absurda, irrespirável.

Há uma corrente de pensamento que defende a teoria segundo a qual de nada adianta você ter tudo se não tem liberdade. E por acaso no democrático Brasil temos liberdade? Criou-se a ilusão que vivemos numa democracia porque votamos nos governantes que aí estão. Alias liberdade de não votar temos. Mais ainda: os eleitos não cumprem nada dasquilo que levou o eleitor a votar neles e fica por isso mesmo. O atual governo (e os anteriores também) não dá ao povo seus desejos básicos: saúde, educação, transporte, segurança, enfim qualidade de vida, prometido nos palanques. E igualmernte fica por iosso mesmo. Onde está o exercício da democracia no sentido básico pensado pelos gregos?

Democracia aqui é um mito, é um eterno fingir, um faz de conta que só atende ao interesse de grupos social e politicamente hegemônicos, que manipulam e tratam o povo como bibelô, distribuindo a ele cestas básicas e outras empulhações.A decisão do Supremo Tribunal Federal praticamenete acabando com os poderes do Conselho Nacional de Justiça é a prova mais concreta disso. Juizes, desembargadores e ministros que vendem sentenças, que enriquecem bem mais que seus salários permitiriam vão continuar  livres, leves e soltos. 
Qual, enfim, a diferença dessa democracia da tão criticada ditadura sanguinária e manipuladora de Kim Jong-Il na Coréia do Norte?

domingo, 18 de dezembro de 2011

CONTO DE NATAL

Maurelio Menezes



Criação: André Comte-Sponville
- Mamãe! O que é felicidade?

Quando o menino fez a pergunta não fazia idéia que na resposta
estava o segredo da vida... Descalço, sentado no chão de terra batida, brincava, tranqüilo... 


- Vrrruuuummmm, vrum, vruuuuuuuummmmmm!!!!!

A mãe olhou para o filho. O rosto era de quem estava dirigindo um super conversível numa uma pista sem fim. Na mão, um pedregulho que, depois de anos e anos acariciado pela correnteza do rio, tinha um formato que até parecia um carrinho. Parecia...

- Felicidade, filho? Felicidade é... como vou te explicar.... 

- Deve ser muito complicado mesmo, mamãe, porque nunca vi nenhuma gente grande dizendo o que que é. Todo mundo fala o que que é um carro, o que que é uma casa, o que que é uma roupa, o que que é um sapato... vruuummm, vrum, vruuuumm... -e estacionou o carrinho.

- Sabe que é, filho.. A gente grande vive muito preocupada com essas coisas porque elas acabam sendo necessárias na vida. A gente precisa do sapato... precisa da casa...

- ..e não precisa da felicidade, mamãe?

- Precisa, filho... Precisa muito. É que desde muito tempo, quando chega numa fase da vida, nossos sonhos acabam sendo sufocados por essas necessidades... Nossas ilusões ficam esquecidas em alguma esquina da cidade... A gente deixa de olhar para as coisas mais simples da vida.. Só as crianças olham para elas...

- Por quê, mamãe? Gente grande não foi, um dia, gente pequena?

- Foi filho... Mas quando a gente cresce perde , como vou te explicar.... a inocência... 

- Eu sempre achei que ser inocente era uma boa coisa...

- É meu filho... Talvez seja a coisa mais importante da vida... Mas até o significado de inocente os adultos mudaram. Hoje, quando se fala em inocente logo se pensa no oposto, culpado. O sentido de pureza está meio que deixado de lado...

- Você não me disse ainda o que é felicidade. Eu posso dar mais umas voltinhas com meu carrinho antes de ir tomar banho?



Anônimo
- Pode, filho... Felicidade é poder brincar com um carrinho... Com esse carrinho.
felicidade, filho, é olhar pela janela e ver a vida em cada coisa... um passarinho na árvore... alguns peixinhos... duas tartaruguinhas... quatro sapinhos na grama... uma flor... uma criança que passa... um adulto que vai... Felicidade, filho, é a própria vida... é o respeito á vida. Sós as crianças percebem isso...


- Mas a gente não sabe o que é felicidade...

- Não sabe, mas sente, filho... Os adultos sabem, mas não sentem..

- Mas sempre foi assim, mamãe?

- Não filho... Houve uma época em que o homem era feliz. A vida dele se resumia a fazer aquilo que era necessário ser feito para que ele sobrevivesse..

- E porque tudo mudou?

- Ninguém sabe, filho, ninguém sabe...

- Olha, mamãe, uma estrela candente...


- Cadente, filho.. Vamos fazer um desejo.. Uma estrela igual a essa, há muitos anos, se transformou num símbolo de mudança... O homem aprendeu que o amor e o respeito ao próximo eram o caminho da felicidade...

- Parece que não adiantou muito, não é, mamãe? Ele se esqueceu de tudo de novo...

- É verdade, filho... Pior ainda... Se esqueceu e teima em não lembrar...

- Será que tem alguém seguindo a estrela cadente?

Papel de parede
- Tomara que sim... Pode ser alguém que, em vez de presentes, traga outros ensinamentos tão simples... Por exemplo, que todos somos diferentes... E que somente o respeito às diferenças é que vai evitar guerras, que vai aproximar os homens, vai mostrar o quanto é importante a convivência... O quanto é importante se eliminar não as diferenças de pensamento e de idéias, mas as diferenças econômicas e sociais...

- Quem sabe, mamãe, esses Reis ensinem a gente grande a olhar pela janela...

- Seria muito bom, filho, porque dois mil anos depois nós desaprendemos..... não estamos mais olhando pela janela...

- E vai adiantar, mamãe? Se a gente grande já desaprendeu uma vez vai desaprender de novo...

- Pode ser que não filho... Pode ser que daqui a dois mil anos tudo volte a ser como antes, quando o homem só matava os animais que precisava matar para sobreviver... Nunca pescava mais do que precisava... Só arava a terra que precisava arar... Só tirava da terra o que realmente necessitava... O homem lutava, mas não guerreava... Se o homem aprender mesmo a olhar pela janela, filho, vai ver que a vida só tem sentido a partir dessas coisas simples...
- Felicidade é uma coisa simples, mamãe?

- Não, filho, felicidade não é uma coisa simples... As coisas simples é que são a felicidade... Você já fez o seu pedido para a estrela?

Foto: Antonio da Silva Couto
- Já, mamãe... Eu quero que você, o papai, a vovó, o vovô, o titio, a titia, minha maninha e todo mundo nunca deixem de olhar pela janela e ver essas coisas simples. Eu quero que o mundo seja feliz, mamãe...

- Vai ser filho... Vai ser -disse a mãe olhando para a estrela cadente e para o filho que brincava com seu conversível último tipo numa pista sem fim.