quarta-feira, 2 de outubro de 2013

CONCILIAÇÃO OU IMPOSIÇÃO?

Maurelio Menezes

Posto de Conciliação - Praça Alencastro
A prefeitura municipal de Cuiabá está encerrando um programa de conciliação de dívidas de habitantes da cidade, principalmente referentes ao IPTU, que tem na cidade uma das maiores taxas de inadimplência do país, algo em torno de 60 por cento, pela informações que tenho. De acordo com informações da secretaria de Finanças espera-se arrecadar cerca de 100 milhões com esse programa que, teoricamente, deveria ser bom para ambos os lados. Mas só teoricamente.

Os contribuintes deixaram de pagar o imposto pelas mais diversas razões. Há quem não tem escritura do imóvel, mas recebe a cobrança... Há quem comprou um imóvel, fez a transferência pagando todas as taxas municipais (ITBI, etc.), mas continuou a receber a cobrança no nome do proprietário antigo... Há quem deixou de pagar alegando ser um protesto pelo fato de a prefeitura jamais ter prestado nenhum tipo de benefício nem mesmo próximo do endereço do imóvel... Há quem não pagou porque teve que optar entre pagar o imposto e colocar um pouco mais de comida (ou até mesmo remédios) em casa... Enfim, há de tudo. E o detalhe é que em todos os postos de conciliação o aparente perfil de quem estava lá era o de pessoas simples, humildes. Os grandes devedores do IPTU não se fizeram presente. Seria o acerto deles feito de outra forma?
Como instituição que teve ter como principal objetivo a prestação de serviços e a preocupação com os aspectos sociais que envolvem seus contribuintes, a prefeitura deveria levar em conta todos esses fatores (e outros não apontados aqui) para fazer uma conciliação. Não foi isso que aconteceu. O que houve foi uma imposição e cobranças que me parecem abusivas e para as quais não havia ninguém no local para dar explicações minimamente aceitáveis.
O Edital aprovado na Câmara para a Conciliação foi desrespeitado em diversos ítens. E, sobretudo, surgiram numeros não previstos nem mesmo no link onde o contribuinte pode pesquisar sua situação fiscal. Vamos aos fatos:
1. Deveria haver pelo menos um Procurador em cada local onde estivesse sendo realizada a conciliação. Hoje, quarta-feira, não havia nenhum na Praça Alencastro. Pelo menos foi essa a informação que davam a quem os procurava  (isso sem contar os funcionários que chegaram depois de 08h00 quando começou o atendimento);
2. Na planilha com os débitos  inseriram um item Atualização que nenhum conciliador sabia explicar do que se tratava. Em pelo menos um caso, depois de muita insistência,  uma jovem que se apresentou como "advogada concursada formada na UNIC e com registro na Ordem"  informou que se tratava da "atualização monetária" da dívida. Peguntada o que seriam, então, os juros igualmente cobrados e que , esses sim, existem para atualizar monetariamente a dívida. Aliás, por isso mesmo eles sçao conhecidos como juros de mora. Ela enrolou, enrolou, mas não explicou. Pelo contrário, a explicação que deu deixou mais claro que se tratava da mesma coisa. Cometeu, inclusive, o absurdo de dizer que os juros eram de um por cento ao mês para, como prevê a legislação, dar 12 por cento ao ano. Primeiro que um por cento ao mês dá mais que 12 por cento ao ano. E segundo, e principal, não existe legislação que fixe a taxa de juros em 12 por cento ao ano. A verdade, me parece, é que davam um desconto nos juros e devolviam a cobrança nesse item inventado. Há um caso, inclusive, em que a atualização de um IPTU atrasado de 2002 foi de quase 500 reais. Mas a atualização do IPTU atrasado de 2001 do mesmo contribuinte foi de menos de cinco reais.
3. A "advogada concursada" garantiu que todas as dívidas que estão no sistema foram inscritas na Dívida Ativa antes de completarem cinco anos. E mostru no sistema  um caso em que um IPTU de 1998 foi inscrito na divida ativa em janeiro de 1999. O devedor garante que não é verdade porque ele é o caso em que a cobrança ia no nome do proprietario anterior. E foi todos os anos até a prefeitura para resolver o problema (somente solucionado quando houve uma interferencia direta do então prefeito Roberto França e do então secretario de Finanças, Vivaldo Lopes a quem ele conhecia) e nunca constava como dívida ativa. Logo a inclusão na dívida ativa, pelo menos nesse caso foi feita por um passe de mágica.
4. A prefeitura está cobrando "emolumentos" e todas as prestações pactuadas com os constriuintes, o que me parece mais um abuso. Juridicamente podemos definir emolumento como sendo "[...] taxas remuneratórias de serviços públicos, tanto notarial, quanto de registro, configurando uma obrigação pecuniária a ser paga pelo próprio requerente.".  Acontece que o requerente fez a requisição apenas uma vez, no momento da conciliação. Mais uma prova que essa cobrança é abusiva e que a propria prefeitura ao enviar o carnê do IPTU para o contribuinte cobra o emolumento, hoje em R$ 14,74 apenas uma vez. Isso significa também que um contribuinte que parcelou a divida dele em 48 vezes irá pagar cerca de 700 reais a mais para a prefeitura.
5. Feito o acordo é calculado um percentual de 5 por cento como "honorários advocatícios". Uai! Mas os advogados da prefeitura já não recebem salários, pagos, diga-se de passagem com o dinheiro do contribuinte? A "advogada concursada" disse que essa cobrança está prevista no Estatuto da Ordem e no Estatrudo dos Procuradores. Pode até estar, mas, no caso,  é imoral. A prefeitura não é uma empresa que está tentando recuperar ativos perdidos. E nesse caso não está tendo despesa alguma (nem mesmo os boletos do acordo eles estão imprimindo. Os conciliadores têm ordem de imprimir no máximo quatro). A conciliação, que mais parece uma imposição, não está requerendo o serviço de advogado algum. Mais ainda. Diversas pessoas que foram procurar a conciliação afirmam que jamais foram notificiados de nada. Ou seja,  o contribuinte está pagando  por um trabalho que não foi feito em momento algum.
A tal "advogada concursada" repetiu diversas vezes que caso o contribuinte não concordasse com o que estava no sistema era simples: que entrasse na justiça contra a prefeitura. Um péssimo comportamento para quem está começando a carreira pois demonstra não ter sensibilidade para perceber o que significa a profissão que ela abraçu e muito menos o local onde trabalha.
É lamentável tudo isso que pode até não ser, mas tem todas as caracteristicas de um golpe (mais um) em cima do contribuinte, pois a impressão final é que a prefeitura, nesse episódio, está se comportando como uma empresa de quinta categoria que anuncia uma liquidação, mas antes de iniciá-la aumenta o preço dos produtos que vende num percentual superior ao desconto que irá dar ao consumidor. Muito triste isso.

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