quinta-feira, 31 de outubro de 2013

NA FOLHA DO ESTADO, HOJE, NOSSO PAPO É SOBRE BLACK BLOCS


Maurelio Menezes



No terceiro artigo da série que me propus escrever para o jornal Folha do Estado de Mato Grosso sobre Movimentos Sociais, nosso papo hoje é sobre os Black Blocs. Há tempos venho, especialmente no  Facebook, questionando, não a ação mas se os BBs brasileiros são mesmo Black Blocs. Nunca descartei a infiltração. E agora ela está, pela primeira vez desde muito tempo, sendo investigada. Existe a possibilidade, acredita a policia paulista que parte das ações tenham sido orquestradas de dentro dos presídios...  Abaixo, o texto na íntegra, que voce pode ler ta,bém na Folha do Estado.

 
Black Blocs: um movimento que só é novidade para o governo

A onda do momento são os Black Blocs. E aqui vale uma explicação: é “blocs” em oposição a “blocks”. O primeiro significa um agrupamento de pessoas para a realização de uma ação. Essas pessoas não precisam necessariamente  voltar a se encontrar em outra ação. Já “Blocks” é uma agrupamento sólido de matéria inerte. Ou seja, a primeira se movimenta e a segunda não.

Pois bem... O Ministro Chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, reconheceu publicamente que o governo ainda não conseguiu entender o que sejam os Black Blocs. De acordo com ele, faltam interlocutores para dialogar com o governo para que se possa compreender esse movimento social.  Estranho, muito estranho, um ministro dizer isso, porque demonstra total desconhecimento do que seja esse movimento, que tem pelo menos vinte anos. E isso é inaceitável para alguém que ocupa um cargo tão importante e que está incrustado no poder feito tatuagem há pelo menos dez anos.

Eles, os Black Blocs, ficaram famosos quando em 1999, atacaram e destruíram fachadas de lojas e do escritório do McDonalds, da Starbucks e de outras grandes empresas para protestar contra uma reunião de ministros de países  associados à Organização Mundial do Comércio. Eles haviam surgido pelo menos oito anos antes, para protestar contra a Guerra do Golfo e se inspiraram nos movimentos autonomistas alemães da década de 80, que pretendiam, além de um confronto claro com o Estado policial, mostrar uma forma radical de ação aos demais movimentos de protesto.

Outra característica dos Blacks Blocs é exatamente não ter interlocutor, devido à sua faceta anarquista. Por isso soa estranha a fala do ministro, especialmente se levarmos em consideração que as principais ações são desenvolvidas em Estados onde o partido do governo tem interesse especial nas eleições do ano que vem: São Paulo e Rio Janeiro.

Nunca é demais lembrar que, na década de 70, o regime militar tinha o costume de infiltrar agentes no meio das passeatas pela Anistia, com o objetivo claro de começar uma confusão. Era a deixa que a cavalaria esperava para atacar, espancar todo mundo e acabar com as passeatas que, àquela altura, já eram “toleradas”. Será que os BBs brasileiros são mesmo Black Blocs ou agentes infiltrados para dar inicio às agressões e assim abrir espaço para a grande mídia, redes de TV especialmente, bater na tecla da violência da policia nesses estados (como se ela não fosse violenta nos demais),  e na tecla de “vândalos” e “vandalismos”?

Os BBs são anticapitalistas, daí o fato de  concentrarem seus ataques em bancos e outros símbolos do capitalismo. Há pesquisadores, entretanto, que os classificam como antissistema. Eles não concordam com o sistema como ele está funcionando hoje. E aí temos uma semelhança com os protestos de maio/junho no Brasil, protestos que, aliás, o governo também disse não entender.

Boa parte das palavras de ordem era contra o capitalismo, mas a maioria era contra o sistema, contra a forma que ele age hoje, mais desumano que nunca. O que se pediu nas ruas foi saúde, transporte, educação de qualidade, e combate à corrupção. E aí pode-se afirmar, sem medo de errar, que mais uma vez perdeu-se a grande chance de fazer uma transformação radical na vida do cidadão. O Legislativo e o Executivo tinham o pedido da “voz rouca das ruas”, mas preferiu não ouvi-la. O Ministro Gilberto Carvalho disse na época que havia interlocutores e que as reuniões com eles resolveram os problemas. Pura propaganda. Nas reuniões com o governo participaram apenas os grupos ligados ao próprio governo.

Já escrevi aqui que criou-se uma imagem, falsa sob todos os aspectos, que o brasileiro é um povo dócil, que beira a indolência, a anomia. A grande mídia tenta de todas as formas mostrar que o cidadão comum não aprova a tática dos Black Blocs. O Data Folha até pesquisa realizou (na verdade, uma sondagem) para mostrar isso. Parece que se esqueceram que não é de hoje que moradores da periferia das grandes cidades reagem com violência à violência do estado, fazendo barricadas, queimando pneus e fechando estradas. E ninguém falava em vândalos nem em vandalismo.

A grande verdade é que a reação dessas pessoas, desde sempre, é a reação de quem vive na pele a desigualdade que no Brasil, a cada dia ganha contornos mais trágicos. E que os sucessivos governos, inclusive o atual, nada fizeram para mudar esse quadro. A tal transformação da sociedade se torna a cada dia mais urgente.

A questão, me parece, é: a quem interessa que tudo continue como está com o abismo entre os que ganham mais e os que ganham menos aumentando cada vez mais? A quem interessa que os subalternos sejam cada vez mais subalternos?

 

 

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