O artigo assinado por mim e publicado hoje na Folha do Estado de Mato Grosso, tem como centro o julgamento do mensalão, as reações apaixaonadas de ambos os lados e sua relação com os Movimentos Sociais, visto por alguns analistas internacionais...
E POR FALAR EM MENSALÃO...
Não existe nada mais velho no Brasil
que esse termo, “mensalão” que, salvo raríssimas exceções, é distribuído nas
câmaras municipais, nas assembleias legislativas, na Câmara Federal e no
Senado. Mas é engraçado que o corretor do Word não o reconhece, como se ele não
existisse nem no vocabulário nem na prática.
Durante os protestos de maio e junho
no Brasil, havia muitos gritos nas ruas. Analistas internacionais foram
unanimes à época: os protestos não eram contra este ou aquele partido, contra
este ou aquele governo. Não eram nem mesmo contra o capitalismo, embora em
muitos cartazes se liam palavras de ordem contra ele. Os protestos eram contra
o sistema, como ele está funcionando. E estava (e continua) funcionando mal,
muito mal.
No Brasil as análises vieram
acompanhadas das paixões políticas partidárias que sempre atrapalham a lucidez
do pensar. E agora não está sendo diferente. Quando Lula nomeou Joaquim Barbosa
como Ministro do Supremo Tribunal Federal quis, de acordo com alguns analistas,
fazer marketing: seria o primeiro Presidente da República a nomear um Ministro
negro para a mais alta corte jurídica do país. Agora as mesmas pessoas que
enalteceram o fato e afirmaram coisa do tipo “só mesmo um Presidente que veio
do povo faria isso” estão tentando crucificar o Ministro que, de eleitor de
Lula, acabou se transformando em seu algoz. E nas mídias sociais não raro as
agressões a ele são racistas, extremamente violentas e de mau gosto.
Nas manifestações brasileiras um dos
gritos das ruas era exatamente a prisão dos mensaleiros. Elas estão sendo
realizadas agora, mas falta muita gente, como falta, também, a investigação do
mensalão mineiro. Com o inicio do cumprimento das penas dos condenados por
acusações pelas quais não têm mais direito a recurso, a voz das ruas finalmente
está sendo ouvida? Há quem diga que não. Essa seria apenas mais uma forma de o
governo ter a seu favor a implacabilidade no julgamento de quem foge às regras
da ética, mesmo que tenha que se cortar na própria carne, para usar uma frase
do senso comum.
Outros gritos ouvidos nas ruas estão
sendo ouvidos, embora tardiamente. As votações secretas no Congresso vão
acabar, mas apenas parcialmente. Há muita coisa a mudar. Paulo Gerbaudo,
professor de sociologia do King`s College de Londres, se referindo as manifestações
no Brasil, comentou que o protesto que começou com a questão da tarifa de
ônibus, acabou se transformando num grande movimento contra a truculência
policial, a ineficácia do estado, o autoritarismo, a falta de liberdades e,
principalmente, a corrupção. Para ele, esses movimentos promovem uma mudança
que é cultural. O próximo passo será saber se as organizações sociais e
políticas terão condições de construir um trabalho que eleve às mudanças
pedidas nas ruas: mudanças políticas, sociais e econômicas. Mas mudanças de
fato.
Para o espanhol Manuel Castells, os
movimentos de maio e junho deixaram claro que a maioria dos cidadãos não se
sente representado pelas instituições tal como elas estão organizadas hoje. Por
isso ele conclui que na era da informação os sujeitos realmente capazes de
produzir a transformação da sociedade são os movimentos sociais.
Hoje muita gente brinca nas mídias sociais
afirmando que o gigante acordou deu uma espreguiçada e voltou a dormir. Mas para
que a tese de Castells se concretizasse seria necessário que os manifestantes
rompessem com os códigos do poder dominante e criassem redes alternativas que
tivessem por base uma identidade coletiva de resistência. Mas será que estamos
preparados para isso? Ou nossas paixões partidárias continuarão a falar mais
alto como parece estar acontecendo agora com a prisão dos mensaleiros?
P.S. Dia desses conversando com uma
espécie de consultora para quem sempre leio meu texto antes de enviá-lo para a
redação, ela comentou que eu estava entrando muito na política e fugindo um
pouco da educação. Ai me lembrei mais uma vez de Gramsci, para quem educação e
política se misturavam como se fossem uma única coisa, ou seja, para ele, para
a política é educativa e a educação é politizante, no sentido mais amplo que se
possa conceber política.