Maurelio Menezes
A 8ª Edição do Festival Calango foi apresentada na Casa Fora do Eixo, em Cuiabá. Há pouco a blogueira e produtora cultural Marielle Ramires postou em seu blog um texto absolutamente redondo sobre o que foi e no que se transformou esse que, sem dúvida alguma, é hoje o mais importante festival de musica popular contemporanea. Pela qualidade e pela importancia do texto, eu o reproduzo aqui. Mas se você preferir pode conferir o original com direito a um video de apresentação do festival.
O FESTIVAL CALANGO E A ERA DIGITAL
Marielle Ramires*
A internet impactou a forma de pensar do homem contemporâneo. No aspecto sócio-econômico, as mudanças implicadas são potencialmente as de maior impacto desde a Revolução Industrial, e afetaram profundamente a organização tanto da economia como da sociedade.
A tv levou cinquenta anos para se popularizar. A internet o fez em apenas dez. Estima-se que um em cada três brasileiros já estão conectados à internet, o que representa setenta milhões de pessoas em todo o país. Número que só vem aumentando. Pesquisas revelam que só em 2006, 12 milhões de computadores pessoais foram vendidos. Isso representa toda a população da megalópole Tóquio.
Com a popularização, a rapidez e a instrumentalização destas tecnologias no cotidiano de milhares de pessoas em todo o mundo, elaborou-se um conjunto de práticas sociais características do século XXI, pautadas em princípios como participação popular, interatividade, colaboração, compartilhamento, entre outras, próprias destes novos tempos.
Essa nova forma de dialogar vem alterando paradigmas certamente também no campo de negócios. O mercado da música brasileira, por exemplo, vive um momento ímpar no país hoje. As novas tecnologias digitais baratearam os custos de produção no setor, e promoveram amplo acesso aos produtos musicais gerados por cantores e grupos de qualquer época, em todo o mundo.
Através do então Napster, e depois, de outros softwares de downloads de arquivos, foi possível acessar qualquer fonograma em formato mp3 e outros disponíveis na web, a custos quase zero.
O resultado foi que a indústria fonográfica - que até a alguns anos era hegemônica no mercado musical - vem sofrendo duros golpes em virtude da queda nas vendas de CD`s. Para se ter uma idéia, segundo matéria publicada no site da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo, os discos de ouro, que representavam 100 mil cópias vendidas, hoje representam 50 mil; e os de diamante que representavam 1 milhão de CDs vendidos, hoje equivalem 250 mil.
No contraponto a esse novo cenário experimentado pela grande indústria, é observado um contexto marcado pelo chamado fenômeno "Calda Longa". A Calda Longa assim intitulada pelo pesquisador Chris Anderson, é classificado como um processo de transformação do mercado dominado por poucos hits, para aquele marcado por inúmeros nichos e de micro-hits, o que nos faz pensar que foi-se a época em que uma música estourada nas rádios, ou que haverá mais grupos que abocanharão grande parcela do mercado. Ou seja, está em ascenção o fortalecimento do mercado da música independente e de iniciativas associadas em redes de relacionamento, ou redes sócios-musicais, como o Circuito Fora do Eixo, as Casas Associadas e a Abrafin.
A Abrafin, a exemplo dessas iniciativas, é uma Associação Brasileira de Festivais de Música Independente, que reúne cerca de 40 festivais de música em mais de 20 estados diferentes, e que faz circular por ano, mais de mil artistas e grupos do Brasil, América Latina e outros países do mundo.
Os festivais de música independente são considerados uma das principais plataformas de circulação e distribuição da música independente brasileira contemporânea, convencionou-se afirmar, em virtude disso, que a nova cara da música brasileira passa por ali.
O Festival Calango faz parte desta rede sócio-musical nacional. É considerado um dos principais eventos deste circuito, sendo que em Mato Grosso, é o principal representante desta nova era de diálogo.
O Calango é um dos projetos que fazem parte do calendário de ações do Espaço Cubo, instituto cultural cuiabano que desenvolve trabalhos nas áreas de cultura, comunicação livre, artes integradas e economia solidária, com parceiros em todo o Brasil.
Em 2010, chega a sua 8ª edição, exibindo, mais uma vez, o que há de melhor na nova safra da música popular contemporânea produzida por artistas não vinculados a grandes e /ou médias gravadoras. Além dos shows, propõe o diálogo com outros campos da cultura, e também o debate sobre sustentabilidade e autogestão, evidentes nas oficinas, palestras, conferências, mostras, rodadas de bate-papos, atividades em escolas e uma feira de tecnologia solidária com produtos culturais produzidos por profissionais ligados ao setor.
O Calango surgiu em 2001, em um período em que o setor da música em Cuiabá era dominado pelo circuito cover de barzinhos. Desde então, o festival cresceu; deu palco a mais de trezentos grupos e artistas populares de todo país e América do Sul, especialmente os do chamado fora do eixo; ganhou visibilidade nacional; revelou grandes talentos cuiabanos para o Brasil, como o Vanguart e o Macaco Bong; e colocou a capital de MT em papel de destaque em meio a produção cultural nacional.
Em 2010 uma das metas é intensificar ainda mais a proposta, promovendo uma grande mostra de artes integradas e tecnologia de gestão com ênfase na música independente.
* Marielle Ramires é Gestora do Setor de Negócios do Espaço Cubo, Diretora de Comunicação da Abrafin e agente do núcleo de sustentabilidade do Circuito Fora do Eixo e coordenadora da FDE Eventos.
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